Teatro, Autismo e desenvolvimento socioemocional
Uma proposta de intervenção interdisciplinar
Extroversão, apresentação, criatividade, eloquência, liberdade, arte, diversão, versatilidade, adaptabilidade, emoção, mágica; o imaginário popular associa essas e muitas outras palavras à ideia de Teatro. Mesmo pessoas que nunca foram ao teatro ou assistiram uma peça tem esse imaginário construído em suas mentes e uma sensação sobre o que essa arte representa.
De fato, poderíamos dizer que o teatro, em suas diversas formas, é uma arte do relacionamento.
E o que isso significa exatamente?
Em primeiro lugar significa que o evento teatral é mais do que uma representação da vida cotidiana. Também o é, ou pode ser, mas se fosse só isso não teria a potência milenar que tem. A arte imita a vida ou a vida imita a arte? Essa questão foi posta por mais de um pensador em mais de uma época, e se essa pergunta parece um ciclo infinito ao estilo “o ovo e a galinha” talvez devamos chegar à conclusão de que “a arte é a vida e a vida é a arte” ou, pelo menos, de que há algo vivo na arte e algo artístico na vida.
Essa pequena introdução levanta a poeira para inúmeras questões e associações, e são tantas que você que leu o título desse texto pode parar e pensar: “Muito bem, mas o que isso tem a ver com autismo?” e essa é uma pergunta justa de ser feita nesse ponto, então vamos tratar dela.
Qualquer um que convive ou conviveu com uma pessoa diagnosticada com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) sabe das dificuldades relacionais, de comunicação e de compreensão do mundo interno e externo que essas pessoas vivem. Independentemente de onde um TEA está no espectro, ou do nível de comprometimento que ele apresenta, é sempre importante pensar em uma intervenção humana, eficiente e completa. E aqui o teatro pode exercer uma função muito importante.
Falamos já da relação entre vida e arte, e de como o teatro é uma arte das relações. De fato, qualquer profissional da área sabe que precisa estar disponível para se tornar um ser humano em constante evolução. E qualquer um que já estudou ou treinou essa arte pode compreender que os exercícios e ferramentas necessárias são feitos para desenvolver, além de capacidades técnicas e virtuosas de como declamar um texto ou produzir certo efeito com o corpo, a capacidade de leitura e uso de relações interpessoais (capacidade de entender e se comunicar com o outro e o mundo externo), intrapessoais (capacidade de entender e se comunicar com seu próprio corpo e mundo interno) e empatia. Essas capacidades humanas essenciais para o trabalho do ator são também as dificuldades presentes no TEA, assim sendo o treino do ator pode ser adaptado para colaborar com o desenvolvimento de qualquer criança.
Qual o objetivo do Teatro Terapêutico ?
Diferentemente de um curso de teatro, no qual o objetivo final é o trabalho artístico e essas ferramentas são estudadas conforme a necessidade da arte, na intervenção a partir do teatro o enfoque é o desenvolvimento dessas ferramentas, e a arte nos ajuda a alcançá-las. O ambiente artístico de uma sala de ensaio permite que trabalhemos as habilidades socioemocionais em um ambiente controlado, que não só “imita a vida”, mas busca relações reais entre seus participantes. A intervenção aqui é construída em conjunto com os princípios da Ciência ABA, considerando e desenvolvendo os objetivos individuais de cada participante.
O ponto de acréscimo de uma oficina de teatro como intervenção é a possibilidade de apresentar mais uma forma de se relacionar consigo mesmo e com o mundo, criando um ambiente micro e controlado da vida, para que as crianças possam treinar e se acostumar a entender a “macro” vida, oferecendo um ambiente propício para desenvolver suas habilidades e individualidades.
A oficina de teatro é dirigida sempre por dois terapeutas e acontece, geralmente, em grupo. Em casos específicos pode ser realizada individualmente. Sua duração pode variar de 30 minutos a 1h30 dependendo da necessidade dos participantes.